segunda-feira, 12 de abril de 2010

"Os psiquiatras anestesiam-me o Amor!"

Quantos divórcios terão sido causados por excesso de serotonina e amores perdidos na fluoxetina?

Para os cínicos, para os iconoclastas, para os despegados emocionalmente e outros desventurados sempre foi fascinante o percurso que o amor tem feito em termos de decomposição química. Já lá vão quase duas décadas desde que este assunto entrou no circuito "do conversar para impressionar". Foi ali algures naquela meia dúzia de anos que mediaram o boom do Prozac e a revolução do Viagra, o período em que os jovens perderam o direito a ser miseráveis e os velhos ganharam a possibilidade de regressar em pleno às casas de alterne.

Ficámos pois a saber - esta era a versão tosca - que o amor era 'apenas' um cocktail químico no cérebro. Isso permitia alguns conselhos parvos. "Era uma vadia... e isso que sentes agora são apenas pós de perlimpimpim no cérebro, meu amigo... vais acabar por esquecê-la... imagina que atiras umas baldadas de água no hipotálamo e passas a esfregona do desprezo..." Um conselho tão imbecil como é sempre tentar animar um corno manso.

Um tipo distrai-se uns anos mas a Ciência não pára. Hoje, o cérebro já foi de tal forma scanado que não só se sabe onde está plantado o amor romântico como se compreende, por exemplo, as suas semelhanças com a adição à cocaína. As ressonâncias magnéticas demonstram que a zona estimulada é a mesma e a privação tem efeitos similares à abstinência desta droga, dado que as células do cérebro que libertam dopamina estão 'encostadas' a uma zona que 'gere' as obsessões e as pulsões. Digamos que foi uma escolha problemática para estacionar o Amor, dada a má vizinhança, com óptimos resultados para as estantes de poesia.

Alega-se: para quê saber a fórmula do chocolate se só o vamos comer? Tanto os livros como as palestras online da bioantropóloga Helen Fisher são verdadeiramente arrebatadoras na forma como explica a evolução e a vida sentimental a partir da pequena zona colorida do cérebro na ressonância magnética onde 'descobriu' o amor e que lhe permite declamar poemas esquimós, falar de templos maias, de versos sumérios com 4000 mil anos, de lembrar todos os que mataram e morrem por amor devido a um zona do cérebro que está ali a luzir numa RM.

Que bonita história esta. Não se fosse dar o caso de numa destas palestras me ter apercebido o que poderá ser um lapso nesta lógica, a primeira 'racha' nesta bela ordem amorosa na história da Humanidade detectada pela própria Dra Fisher e provocado pela dupla psiquiatras\indústria farmacêutica ao prescreverem antidepressivos de forma massiva e durante períodos prolongados a pessoas cada vez mais jovens, alterando de forma substancial a química do cérebro. A sobredosagem de serotonina suprime os circuitos de dopamina, associados ao amor e ao desejo sexual. Mais de uma equivale a menos de outra. Ela relata mesmo casos de homens que voltaram a apaixonar-se pela mulher após suspenderem a toma de antidepressivos. Alto lá!

Hoje em dia, qualquer pessoa que tenha levado uns coices da vida já trouxe para casa umas receitas de antidepressivos convencido que vai tomar um analgésico da alma. Um tunning da mioleira. E recusa-se ao desmame. Mas este é um efeito secundário que não consta na bula: "Risco de se desapaixonar pela cara-metade ou de passar pelo amor da sua vida, não o detectar visualmente e de não lhe ligar peva por ter o cérebro atafulhado em serotonina."

Ora, sôtor, em nome dos supracitados desventurados, não posso achar este detalhe despiciente ou de alguma forma passível de ser ressarcido. Exijo, contudo, ser informado brevemente do que poderei ter perdido na vida por seguir a sua medicação. Obrigado.
(LPN)

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